O sentido da Vida - Viktor Frankl

01-01-2016 16:20

Artigo de Sophia Porto Kalaf e Ruth G. da C. Lopes(*)

 

Sobre sua experiência nos campos de concentração o escritor e psiquiatra, Viktor Frankl, escreve: “O que nos importava era o objetivo da vida naquela totalidade que incluiu também a morte e assim não somente atribuir sentido à “vida”, mas também ao sofrimento e à morte. Esse era o sentido pelo qual estávamos lutando!” (Frankl, 2008, p. 103)

em-busca-do-sentido-da-vida-por-viktor-e-frankl-fotoA escolha do tema e do paralelo que se pretende fazer neste artigo se deu a partir de uma aula com a professora Vera Brandão, em que me interessei por histórias relacionadas ao holocausto. Tenho grande interesse na história dos campos de concentração, pensando nos limites a que o ser humano pode chegar quando se tem um sentido para viver. 

A vivência no campo de concentração dificilmente será superada diante de condições de animalização humana que vemos todos os dias. Levanta-se a questão de como sujeitos que não tinham nem o mínimo para sobreviver, conseguiram encontrar forças em situações de miséria e morbidez e, ainda assim, ver algum sentido em seguir a vida. 

A motivação e a essência do viver poderiam ser o alicerce para a resiliência e para a sobrevivência. Observa-se, por exemplo, que no processo de envelhecimento, o homem esbarra, inevitavelmente, em uma resignificação do sentido da vida, perpassando pela história vivida, pelo presente e por projetos futuros. 

Por este motivo, minha intenção neste texto é abordar e aprofundar a busca constante do sentido da vida, inexorável a todo ser humano e o fundamento que esta busca promove. Para isso, será feito um paralelo entre a vivência de Viktor Frankl nos campos de concentração e o processo de envelhecimento, que gera mobilização e necessidade de readaptação do sentido da vida. 

em-busca-do-sentido-da-vida-por-viktor-e-frankl-foto1A obra de Frankl

A obra do escritor e psiquiatra austríaco Viktor Emil Frankl  (Viena, 1905 – 1997) trata da sua vivência nos campos de extermínio, incluindo o temido campo de Auschwitz. Ele descreve como sentiu e observou a si mesmo e as demais pessoas na situação de exaustão, desnutrição, perda dos parentes e quase morte. Cada passagem é descrita cuidadosamente, desde a chegada no campo até a libertação, envolvendo o leitor nas experiências mais cruéis vivenciadas por ele. 

Durante o tempo que permaneceu nos terríveis campos, Frankl observou e vivenciou sensações que não se desejaria a ninguém, como a solidão, a apatia, a dor (tanto física quanto psicológica), a fome, o luto, o vazio. Apesar de todas as perdas que sofreu, Frankl se abriu para os pequenos sinais de sentido que ainda poderiam fundamentar sua vida. Estes sinais fizeram com que ele encontrasse frestas para algo mais profundo, que seria a própria busca do sentido da vida, concebendo, assim, o conceito da logoterapia. 

Portanto, diante da dolorosa experiência que passou, o psiquiatra pode encontrar o sentido para a sua vida, auxiliando outros em suas buscas pessoais, sendo este o fundamento principal da chamada logoterapia. 

Princípios da Logoterapia

O fundamento criado por Viktor Frankl está diretamente relacionado à sua vivência pessoal relatada no livro. Diante de uma experiência cruel, aquele que não vê sentido nas coisas ou acontecimentos, acaba falecendo. Frankl conseguiu encontrar a sua própria razão para viver, propondo às pessoas que diante de um “aprisionamento espiritual” se buscasse um gancho para a libertação da alma e um sentido existencial. 

A noção de responsabilidade é essencial na logoterapia, já que a técnica visa criar no paciente uma consciência plena daquilo que se faz responsável, seja isto objetos, lugares ou até pessoas. O logoterapeuta investe na peculiaridade do indivíduo, trazendo para ele a importância de se trabalhar o sentido potencial de sua vida, ou seja, um projeto de vida – este que pode ser alterado a todo o momento. 

Por isso, o sentido da vida humana não pode ser definido em termos genéricos. A procura pela significação é única e singular entre cada indivíduo e até entre cada momento, em um mesmo indivíduo: “Cada pessoa é questionada pela vida; e ela somente pode responder à vida respondendo por sua própria vida; à vida ela somente pode responder sendo responsável.” (Frankl, 2008). 

A aproximação da morte

Segundo Frankl, “o termo latino finis possui dois significados: fim e meta. O homem que se depara com a imprevisibilidade do final da vida, e que se vê diante de circunstância ameaçadora à integridade, geralmente se mobiliza e se adapta para uma possibilidade de continuar vivendo. Assim, cria metas e projetos futuros, para que internamente viva aquilo que ainda não pode ser vivido. Antecipa-se e visualiza um futuro, podendo mirar para a vida de maneira otimista. Isto seria o entendimento do projeto de vida ou da busca de um sentido para a vida, que está relacionada e figurada na aproximação do fim. Tomar consciência da finitude da vida não pode significar acelerar a hora da morte. Mas, para que a morte nos surpreenda vivos, investimentos afetivos devem ser possíveis e projetos realizáveis” (2008, p. 94). 

O processo de envelhecimento, característico de qualquer ser humano, gera uma série de mobilizações, trazendo questionamentos sobre aquilo que o espera. Lidar com a possibilidade de aproximação da morte faz com que o idoso recorra às vivências passadas, de maneira que esta sustente, juntamente com o que vive no presente, um projeto para o futuro.  

Diante destas recordações, pode rever significados e buscar novas vivências, que ainda podem ser vividas. Torna-se importante valorizar as potencialidades e as possibilidades que lhe são disponíveis, acometendo o sentido de continuar vivendo.                                                                                        

Assim como no envelhecimento, a experiência de quase morte de Frankl faz perceber a relevância desta busca por um projeto de vida, a ser constantemente reelaborada e reestruturada ao longo da vida. O sentido de existir brota aos olhos quando um indivíduo se vê diante da finitude. Por isso, a aproximação da morte poderia ser dita como uma força motivadora para esta busca do sentido da vida. 

"Aquele que tem um porquê para viver pode suportar quase qualquer como"(1), esta frase de Nietzche demonstra a magnitude do “por que” viver, dando um suporte quase que completo para o “como” viver. Apoiando-se no “por que” de existir, Frankl e milhões de outras pessoas que foram para campos de extermínio conseguiram encontrar o “como” viver, seja este enfrentando fome, frio e/ou exaustão, ou seja, um modo mórbido de existir. 

Assim se faz, também, no envelhecimento. Quando o idoso encontra um “por que” de existir, encontra estruturas suficientes para sustentar o “como” existir no mundo. Aqui, é dada grande importância ao passado vivido, já que este permitiu a pessoa ser quem é atualmente. Por isso, a história do idoso seria um sustentáculo para o encontro com o sentido primário de viver, o “por que” de existir. 

Considerações

A responsabilidade e a consciência daquilo que o homem carrega em sua vida são imprescindíveis no processo de busca existencial. Quando se tem um sentido para viver, dificilmente o indivíduo será barrado pelo modo que se vai viver. Seja diante das adversidades do envelhecimento ou da experiência do campo de concentração, o homem transcende a realidade, transpondo-se no futuro, podendo agarrar algo deste tempo que ainda vem, fazendo deste um sentido para viver. 

A reflexão do ser humano faz levantar a questão de como o homem pode superar adversidades quando se tem um projeto de vida. A finitude, neste caso, poderia ser vista como uma força motivadora para esta busca, já que o fim poderia estar mais próximo do que se imaginava. 

Tanto o envelhecimento como a experiência dolorosa no campo de concentração revelam o poder que o homem tem de dar significado às coisas, seja ao mundo ao seu redor ou até a si mesmo, enfim: a sua existência. Traz, portanto, uma abertura para refletirmos: até onde vai a busca de sentido no homem? 

Referências

FRANKL, V. E. (2008). Em busca de sentido. (28º ed.). Petrópolis/RJ: Editora Vozes.

Imagem de Viktor Frankl: https://pt.wikipedia.org/wiki/Viktor_Frankl

Leia mais

AQUINO, T.A.A. Análise da narrativa de Viktor Frankl acerca da experiência dos prisioneiros nos campos de concentração. Rev. abordagem gestalt.,  Goiânia ,  v. 18, n. dez. 2012. 

Disponível em https://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672012000200011&lng=pt&nrm=iso. Acesso em  26/05/2014. 

CARNEIRO, C. & ABRITTA, S.. Formas de existir: a busca de sentido para a vida. Rev. abordagem gestalt.,  Goiânia ,  v. 14, n. 2, dez.  2008 .   Disponível em https://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1809-68672008000200006&lng=pt&nrm=iso. Acesso em  26/05/2014. 

SESC/PUC. (2006). Velhices: reflexões contemporâneas. São Paulo, SESC/ PUC, pp. 90-99. 

(1) Disponível em https://www.quemdisse.com.br/frase.asp?frase=10418

 

(*)Sophia Porto Kalaf é aluna da eletiva “Envelhecimento na Literatura: revelações”, do curso de graduação de Psicologia, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, 5º semestre, ministrado pela profa. Dra. Ruth Gelehrter da Costa Lopes