Uma música, uma história - Agosto/Setembro

13-09-2014 15:50

Na retomada do 2o. semestre, estamos estudando sobre as relações literatura e memória. Os alunos vivenciaram uma atividade de despertamento de lembranças, utilizando as bases sensoriais. 

 

Uma música...uma história

Gira, gira, gira... Rápidas paradas e o ritmo continua. Girando... girando... girando. Aos pares, acomodadas nos assentos, as pessoas giram com a roda gigante, invertendo posições: ora no alto, ora cá embaixo, no rés do chão. Acenos, mãos em concha assoprando beijos e Dalva de Oliveira em sua voz estridente faz a trilha sonora ”Guardo o lencinho branco...” Na geometria dos metais, lanternas tremeluzindo espelham uma miríade de tonalidades de verde, azul, turquesa, vermelho... Espetáculo de luzes, cores, sons e aromas. O perfume do algodão doce, da pipoca e de tantas outras guloseimas impregna as narinas já vermelhas pelo vento que se forma no sobe e desce.

Na barraca das argolas, o jovem ganha um ursinho de pelúcia para a namorada. No tiro ao alvo, o guri, segurando o enorme pirulito, chora porque quer o trenzinho que o pai não consegue acertar.  No carrossel, crianças acenam para os pais encantados com a alegria da petizada.

O serviço de alto-falante dá os recadinhos de amor que um anônimo tímido manda para alguém, oferecendo música. Nos intervalos, faz propaganda dos brinquedos e lanches. O vai e vem de pessoas enche o ar de cheiro bom de grama recém-aparada.  Olhares furtivos, flertes carregados de emoção. É o mundo encantado do parque de diversões numa cidade de pouca ou quase nenhuma opção de lazer.

A garota loira, com longas mechas de cabelos que se agitam como lençóis no varal, segura confusa o vestido rodado “saia baiana” azul de bolinhas brancas que o vento levanta  mostrando as rendas da anágua. Uma criança ainda, que flerta com a maturidade de mulher, fica rubra quando percebe a presença que a deixa hipnotizada. Ele não está girando. Apenas a observa com seu olhar doce cor de açúcar caramelado na espera que parece uma eternidade.

A roda para. Ela desce com o rosto ruborizado, mesclando tonalidades confusas de emoção. O jovem se aproxima como uma súbita rajada de vento. Os olhares se cruzam, as mãos se encontram e se apertam, caminham no meio do alarido da multidão. Momentos felizes, mas fugazes como a presença do parque.

No ano seguinte, parque de diversões estará lá novamente, no mesmo lugar, com as mesmas atrações, as mesmas músicas. Mas a cena de amor já não existe mais para aquela jovem. E Dalva de Oliveira canta “Guardei teu lencinho para recordar a boca que nele deixaste ficar...” O sonho a despertara, brincara com ela e, no final, o desengano. 

Ficaram as lembranças no lencinho manchado de carmim...